Detesto as manhãs... quando acordo, sinto que sou arrancada com violência de um sonho (e que sonho fantástico tive esta noite...)... entretanto arrasto-me até à wc e depois de abrir a torneira do duche, olho-me ao espelho... detesto ver-me pela manhã... desgadelhada, com os olhos borrados da pintura do dia anterior, que não me dei ao trabalho de tirar antes de ir dormir, olheiras muito profundas... enfim, um ar desgraçado e nada airoso... depois do banho sinto-me ligeiramente melhor, mas assim que olho para o espelho... volta a sensação de horror... a borrada da pintura dissolveu-se na água, foi-se, mas ficaram uns olhos mortiços, sem vida e com umas grandes olheiras profundas em volta... à medida que me vou arranjando, a coisa vai melhorando outra vez... mas chegando à parte de me maquilhar... puff... olho outra vez ao espelho e, amis uma vez, vejo aquela cara de pessoa cansada! E para além de cansada, feiosa... passo o corrector de olheira, para ver se disfarço, passo a base líquida, para esconder as bochechas vermelhas que me caracterizam (além do sorriso pepsodente...), o pó, clarinho, para esbater e aveludar a pele, uma sombra escura nas pálpebras mesmo junto às pestanas e, por fim, o belo do rímel... se não me borrar toda nesta última etapa, é uma sorte!
Volto a olhar para o espelho... parece que já vejo as bochechas descaídas... e a maquilhagem não disfarçou assim tão bem as olheiras e o ar cansado mantém-se... Entretanto já me vesti... outra situação que detesto... nunca sei como e o que vestir... a calça de ganga é essencial! E depois?? Uma camisa preta? Uma t-shirt e um pullover (a escolha de hoje)? Um top de meia manga? E pronto... não tenho mais escolhas... sempre o mesmo, sempre as mesmas... e sapatos?? Ultimamente, botas pretas! Salto de cunha!
Olho uma última vez ao espelho... o mesmo ar mantém-se a olhar para mim... credo... não melhorou...
Chega a parte dos adereços... relógio, fio, pulseira talvez e anel! Ainda não tenho coragem de retomar os brincos... acho que o T. mos arranca à primeira hipótese...
Depois acordo o mais velho e esqueço-me daquela primeira fase do dia que detesto...
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Durante o dia, a coisa passa, nem me lembro de olhar ao espelho com "olhos de gente"... mas durante meia dúzia de minutos, como estes, relembro a sensação horrível que tenho todas manhãs... e a música que ouço não ajuda a nada, piora esta minha sensação de incapacidade, de inutilidade, de frustração, de sei lá mais o quê... Porque é que eu simplesmente não dou valor ao que tenho? Porque é que tenho de pensar "e se..."? Porque é que não me sinto sempre feliz com tudo aquilo que alcancei? Sinto que falta qualquer coisa... dantes achava que era uma casa que me faltava, mas não é... já a tenho! Não sei o que tenho nem porque penso as coisas que penso, não sei porque raios fui "abençoada" com uma imaginação muito abundante iconograficamente... talvez esteja na hora, definitivamente, de escrever um livro e de pôr esta imaginação horrível a render! Se pusesse em papel, em jeito de romance (entenda-se como ficação, não precisa ser de "faca e algibeira"), tudo aquilo que me passa pela cabeça, acho que teria algum lucro...
Por vezes sinto que estou à beira de uma depressão, mas noutras alturas sinto também que isso é ser derrotista, pois eu tenho tanta vida e tanta energia (e imaginação....) que não a posso desperdiçar em "depressões", além de que no fundo, não devia ter motivos para isso... tenho uma vida repleta de coisas boas e, claro, algumas menos boas... mas acho que preciso de me aceitar... muito para além de me compreender, preciso de me aceitar e de aceitar aquilo que tenho e de me deixar de "e se..." ou de imaginar aquilo as coisas que imagino... mas para isso tenho de dar uma volta a alguns pontos de vista, algumas formas de ver, algumas formar de olhar... neste momento é isso que me atormenta! Tenho de aceitar que aquilo que eu podia ter feito, já não o posso fazer, além de que era completamente surreal e até amalucado... nunca resultaria em nada, se calhar só em desilusão, lol... infantilidades minhas, como sempre... Qualquer dia marco uma consulta no psicólogo, para ver no que dá...
E o dia passa, com mais ou menos precalsos...
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À noite, depois de vestir o pijama, tudo regressa...
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